O Barquinho Cultural

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domingo, 19 de maio de 2013

Ainda é cedo para termos um filme definitivo sobre Russo


Thiago Mendonça e Laila Zaid (Reprodução)

Há algo de estranho no filme “Somos Tão Jovens”, de Antônio Carlos Fontoura, sobre a juventude de Renato Russo, antes de a Legião Urbana estourar no país. Apesar da advertência no início da projeção, de que a obra é baseada na vida do cantor e compositor, o que leva a concluir que houve alguma licença poética na construção do personagem, Renato aparece como uma pessoa frágil, atormentada, meio perdida sobre seu papel no mundo. Bem distante, portanto, da figura carismática, provocativa e com instinto de liderança que os depoimentos de seus amigos, dados aos jornais à época do lançamento, pintaram.

Não curti de imediato o Legião nem qualquer outra banda de rock que surgiu no início dos anos 80. Vivia uma fase bicho-grilo, pela qual Renato, de acordo com o filme, também passou antes de conhecer o punk rock, e não me liguei muito no rock brazuca que então despontava. Ouvia mais Beto Guedes, Lô Borges e Tarancón, entre outros. E achava esse som bem inferior ao dos pioneiros Raul e Mutantes dos 60/70.

Mas o clima da época, estudante de Jornalismo e nos estertores do regime militar, não permitia que ficasse imune a esse movimento. Não aderi, contudo, de cara à nova onda. Ainda estava a descobrir Chico, Caetano, Gil e Milton, e qualquer coisa abaixo de Beatles para mim era perda de tempo. Fui, mesmo, prestar atenção às bandas bem depois, só para confirmar que muitas delas ou se extinguiram por falta de assunto e de novidade, ou sofreram o desgaste próprio da aderência ao mainstream.

Voltando ao filme, o Renato vivido por Thiago Mendonça ( o Luciano apagado de “Dois Filhos de Francisco”) impressiona pela caracterização, e seu esforço em tocar e cantar ele próprio as músicas deve ser louvado. Não chega aos pés do Cazuza de Daniel Oliveira ou o Jim Morrison de Val Kilmer, mas confere credibilidade. Falar nisso, o Marcos Breda, que vive o pai de Renato, está caricato e estereotipado, bem longe da sua brilhante atuação como Marcelo Rubens Paiva em “Feliz Ano Velho”.

A história tenta mostrar um painel do surgimento das bandas brasilienses, como a pré-Legião Aborto Elétrico, Plebe Rude e Capital Inicial, assunto abordado no livro “O diário da turma: a história do rock de Brasília”, de Paulo Marchetti (2001), porém é mais centrada no próprio Aborto, e ficamos sem saber se Renato e companhia é que deram o start para o surgimento das outras ou foi um movimento espontâneo e simultâneo.

Também não ficamos sabendo se, afinal, Dinho Ouro Preto (depois vocalista do Capital) fez parte desse grupo ou não (ele sempre disse que participou, sim). Em um momento, quando Renato e turma dão entrevista ao jornalista Hermano Vianna – irmão de Herbert, do Paralamas - (ver em http://olicruz.wordpress.com/2013/05/04/hermano-viana-escreve-sobre-o-rock-de-brasilia/), ele explica a miríade de conexões que as bandas praticavam, com todos participando de todas, como uma grande comunidade musical. Coisas do rock, também. Mas fica vago.

Enfim, o Renato do filme é um cara antenado, que devorou clássicos da literatura e da música em seu exílio involuntário por causa de uma doença que o paralisou por um tempo, inconformado com as artimanhas do poder central e com a incapacidade de fazer algo revolucionário (em uma cena marcante, ele cobra dos pais alguma atitude, ao qual o pai pergunta o que ele, um mero economista do Banco do Brasil pode fazer?). 

Parece que o músico encontrou a resposta no punk rock que os amigos filhos de embaixadores lhe apresentaram ao trazer discos de Londres, e partiu para a ação via imagem e atitudes agressivas. Nada mais adolescente.

É incrível supor que uma pessoa com essa reflexão da realidade se tenha transformado em porta-voz da juventude de seu e do futuro tempo (a plateia do cinema em que assisti ao filme estava repleta de adolescentes que aparentemente pouco se importaram de consumir pipoca e refrigerante a preço de refeição completa no shopping). Há realmente algo de estranho no Renato pintado no filme. Creio que o que o diretor tentou foi traduzir em imagens algumas das letras fundamentais do compositor – o que Fontoura até ilustra de maneira pouco criativa, ao colocar versos de algumas canções em frases ditas por Renato aqui e ali.

O filme, afinal, não me emocionou muito, deixou com vontade de quero mais, e a única cena em que senti algum arrepio foi quando ele cantou “Ainda é Cedo”, construída exatamente para surtir esse efeito: a homenagem à amiga querida com quem havia se desentendido e o desenrolar de certa forma evidente. E fica também a dúvida: a tal menina que lhe ensinou quase tudo que ele sabe foi realmente uma mulher ou o famoso pó branco, que alguns insinuam ter sido a fonte inspiradora? O diretor não quis correr riscos, pelo visto. Somado ao perfil insípido que traçou do grande Renato, parece que não quis mesmo.

A colcha de retalhos de Soderbergh

Jude Law e Catherine Zeta-Jones (Reprodução)
"Terapia de risco" (Side Effects), de Steven Soderbergh, aborda males psiquiátricos, como a depressão, mas apenas como pano de fundo para uma trama policial, e passa por leve pela questão da política da medicação às vezes de maneira leviana e o poder da indústria farmacêutica. Catherine Zeta-Jones, bipolar assumida, vive uma psiquiatra envolvida em um golpe sórdido. O filme é bom, se bem que se perde um pouco no desenvolvimento dos assuntos, mudando o enfoque e deixando no ar sobre o quê, afinal, o diretor quer falar. É assunto que daria para explorar bastante. Mas a opção do diretor foi outra, e me frustrou um tanto. O filme aborda ainda a prática de fraude no mercado financeiro, mas também de maneira superficial.

Quanto à Catherine, li no começo do ano entrevista com ela dizendo que aceitou fazer o filme por ser um convite - quase uma intimação - de Sordenbergh, que a dirigiu em "Traffic" e "Doze Homens e Outro Segredo". Ela anda reclusa para cuidar dos dois filhos que teve com Michael Douglas. Mas filmou ainda "RED 2 - Aposentados e Ainda Mais Perigosos", de Dean Parisot (inédito), com Bruce Willis, com quem atuou em "O Dobro ou Nada", uma bobagem de Stephen Frears. Depois do Oscar por "Chicago", de Rob Marshall, parece que tem errado a mão em suas escolhas. Mas é sempre um prazer vê-la na tela.

Irreparável a atuação de Rooney Mara, a protagonista, psicóloga de formação - ela que teve indicação ao Oscar ano passado pela atuação em "Os Homens Que Não Amavam as Mulheres" e foi a namoradinha do criador do Facebook antes de ele "enricar", em "A Rede Social". Consegue enganar bem o espectador, em uma trama bem à la Hitchock. Jude Law também convence como o psiquiatra endividado que se mete em uma confusão da qual sai um pouco herói, desenvolvimento também explorado de maneira vaga e inverossímil por Soderbergh. Confesso que saí do cinema sem entender muito bem o desfecho.